sexta-feira, setembro 27, 2013

Mongolia Bike Challenge - Dia 7



Apesar de ser a etapa mais curta da prova, o acumulado assim como a competição pelo pódio neste derradeiro dia da competição, era previsível que fosse imposto um ritmo intenso. Após poucos segundos de ser dada a partida começamos a subir e houve logo um ataque que resultou numa separação do pelotão. O meu corpo precisa de algum tempo até começar a trabalhar minimamente bem, mas este dia estava a ser particularmente mais penoso que o habitual. A explicação óbvia foi a marretada do dia anterior que me levou ao limite. A recuperação depois de um esforço daqueles é mais demorada.  
Com uma primeira parte relativamente plana o grupo da frente onde seguia permitiu que outro grupo se juntasse formando um pelotão considerável. Mas esta pacatez durou até o percurso voltar a ficar ondulante por volta do km 35. Estava na retaguarda do pelotão quando o ataque aconteceu, perdi o contacto e para recuperar o tempo (não mais que 30segundos) gani tanto tanto que assim que alcancei novamente o grupo foi um alívio enorme.  Mais uma vez reafirmo, nunca ficar sozinho no MBC, nunca! Levar com o vento na cara, pedalar no meio do nada o tempo parece que não passa.
Na contagem de montanha o espanhol Pau Zamora atacou forte, provocando nova separação do grupo. O outro espanhol António Ortiz, o canadiano Cory Wallace e o americano Jason Sager responderam, eu fiquei a ‘’observar’’ juntamente com alguns atletas que não queriam arriscar nada. No grupo onde seguia estava a ser ‘’marcado’’ pelos meus mais directos adversários, um australiano e um inglês. Fiz alguns ataques para tentar separar o grupo para aspirar ao TOP 5 da classificação geral. Nem as minhas pernas estavam a debitar a mesma potência, nem os meus adversários deram tréguas.
Quando começamos a avistar a zona de meta no topo de uma colina tínhamos 80km, pensávamos nós que iríamos directos e que iríamos terminar ao sprint. Mas fomos contornar a montanha, fizemos mais algumas subidas o que permitiu que eu e o Marcelo Zamora nos isolássemos do grupo. O espanhol gentilmente me deixou chegar na sua frente, o que se traduziu na quinta posição na etapa. O Cory não facilitou e voltou a vencer. A americana Sonya Looney ganhou nos femininos, mas nada alterou na classificação geral. A minha posição final foi 7º. Por um lado tenho algum amargo na boca por não ter conseguido entrar no top 5 devido à etapa 6, mas o que é certo é que dei tudo o que tinha e a sétima posição numa competição com muitos atletas profissionais, preparadíssimos não é nada mau.
O parque do seculo XIII onde terminou a etapa pertence ao principal patrocinador da prova, Genco Tour Boreau. Com um amplo visual para a estepe, este local ficará certamente na memória de quem participou na quarta edição do MBC.

Depois de terminar a etapa, ao ver a montanha maravilhosa que estava junto ao acampamento, calcei as sapatilhas e fui fazer Trail Run, ver como é que as pernas reagiam...não reagiram (muito) mal e a vista compensou o esforço. Depois dei uma volta à montanha até regressar ao acampamento a tempo de acompanhar o ultimo atleta a cortar a meta, o amigo argentino Carim que trazia a corrente da sua bicicleta na mão.
A cerimónia de encerramento, o almoço e jantar foi servido dentro do maior Ger do parque. Decorado a preceito, mesas rasas, iluminação controlada, peles e animais embalsamadas espalhados em redor, tudo para retractar o que seria o Ger no século XIII. Ao entrarmos parece que somos de imediato transportados para outra realidade. Os atletas foram brindados com actuações de músicos que utilizaram instrumentos milenares que fez toda a gente vibrar, Houve também um espectáculo de contorcionismo de cortar a respiração. Houve até um Mongol a cantar musica italiana. A organização deu assim a conhecer algumas das tradições deste povo que há alguns seculos atrás conquistou meio mundo usando cavalos e liderado por Chengis Khan. Pessoalmente, esta componente da história e das tradições fascina-me imenso.
Após serem entregues os jersey’s de finishers o dia acabou com mais um espectáculo há volta de uma fogueira com uma encenação da dança do fogo.
Esta intensa semana chegou assim ao fim. Para mim foi uma experiência inesquecível num país que para mim era totalmente desconhecido mas pelo qual me apaixonei. Paisagens de cortar a respiração, pessoas simples e amistosas, os nómadas, os gers, a vida selvagem, a comida, tantas coisas que ficaram retidas na minha cabeça. Mesmo a competição que houve, nunca foi feroz, estávamos todos a viver uma grande aventura.   
Por ser um número relativamente pequeno de participantes, isso fez com que houvesse um grande convívio entre todos, fizeram-se novas amizades, reforçaram-se as existentes, fiquei a conhecer outras provas e foram colocados vários convites para visitas por todo o mundo. Foram tantos que é difícil identificar todos...vou apenas agradecer à aqueles com quem partilhei os Gers ao longo da semana. Obrigado Thomas, Ricardo, António, Marcel, Pau, George, Jake pelos momentos divertidos vividos! Agradeço aos organizadores que tiveram a coragem (e conhecimento) de montar uma prova na Mongólia, um país desconhecido e fora do padrão, mas que é simplesmente apaixonante! Obrigado Rob, Willy, Roberto, Maximmo e Chris. As ultimas palavras vão para o Daniel Jesus, um ''ilustre desconhecido'' para muitos, inclusive para mim! Uma pessoa sempre disponível para ajudar, calma, com um sentido de humor apurado e que já viajou por meio mundo em aventuras. Tive muito gosto em conhecer-te Daniel e partilhar contigo esta aventura.

Claro está que agradeço aqueles que enviaram mensagens, comentários e emails. Mesmo apesar de não os ter visto durante a prova, vi tudo assim que regressei à ''civilização''. Foi muito bom ter esse vosso carinho!
Venha a próxima!...que foi logo a seguir e que em breve partilharei com vocês.

João Marinho








NOTA: Esta prova aconteceu entre 1 e 8 de Setembro, mas não tive oportunidade de colocar os relatos online antes. 




Mais fotos na minha página de atleta no Face Book: www.facebook.com/marinhojoao























quinta-feira, setembro 26, 2013

Mongolia Bike Challenge – Dia 6



O que fica registado são os resultados e hoje o meu não foi tão bom quanto esperava, mas estou feliz pelo que fiz. Vamos por partes. 

A etapa 6 do MBC tornou-se a mais longa com 170km. Os primeiros 80km rolantes ao longo da estepe foi um bom aquecimento para a segunda metade da etapa que era mais ondulante. Apesar de ter havido algumas ‘’picardias’’ dentro do pelotão, este manteve-se praticamente coeso. Dois atletas atacaram logo de inicio e andaram praticamente sozinhos o tempo todo até serem alcançados nos últimos kms. Pouco há para registar até ao ponto que começaram as subidas. Apesar das paisagens serem de cortar a respiração como já estamos habituados, esta primeira parte foi monótona. O que quebrava a monotonia era o piso tipo ‘’tábua de lavar roupa’’ e os bancos de areia que fazia a adrenalina subir e que provocou algumas quedas.

Assim que começaram as subidas as hostilidades subiram de tom. Primeiro foi o Marcel Zamora que escapou do grupo, depois eu arrisquei e coloquei-me em fuga. Tínhamos sensivelmente 85km de prova. Tinha que arriscar a minha sorte e numa subida ataquei e ganhei uma vantagem confortável. Alguns kms depois alcancei um inglês que é repórter da Pro Cycling Magazine e tem a escola toda da estrada, ou seja, um dos atributos é manhosice. Quando chegamos juntos ao segundo posto de abastecimento ao km 100, enquanto eu enchia o meu bidon, saiu disparado a atacar feito maluco. Se há coisa que eu abomino é ataques nas zonas de abastecimento. Tudo bem, já te vou apanhar pensei cá para mim e depois de um par de kms apanhei-o. Depois de puxar alguns kms olhei para ele e tipo, puxas? Vira-se para mim, ‘’no power’’ eu na minha boa-fé, ok eu puxo. Com que então ‘’no power’’ e não me largava a roda. Cheguei a ponto que tinha de descansar algum tempo e disse-lhe que tinha de puxar. De facto ele puxou, mas durante umas centenas de metros. Ao km 125 começo a ver o grupo da frente, o inglês disse que apenas me queria ajudar a apanha-los, mas não é que o artista ataca, deixa-me para trás, passa o passa o grupo e vai-se embora…No final perguntei-lhe, então ‘’no power?’’ vira-se para mim, ‘’the power came back’’ grhhhh!! E a melhor de todas, ele já não está em prova, ontem desistiu! Depois entendi, o outro inglês Matt Page que estava na 8ª posição, separado de mim 30segundos estava no grupo perseguidor e então este outro inglês fez tudo para rebentar comigo…e conseguiu!

Ao km 130 os meus bidons estavam sem nada, ainda faltavam 20kms para o terceiro posto. Comecei a abrandar a cadência, sentia que estava a perder a potência e perdi o contacto com o australiano que seguia comigo e que estava então na segunda posição. Estava a desesperar para que aparecesse as bandeiras assinalando o abastecimento ao longe. Quando finalmente as vi, já estava no limite. Parei e abasteci, o grupo perseguidor alcançou-me neste exacto ponto e quando arranquei o meu corpo não reagia. Bebia, comi tudo o que tinha mas cada vez estava mais fraco…o homem da marreta apanhou-me. Veio o flashback da 7ª etapa da TransPortugal de 2007 quando tive pela última vez a mesma ‘’sensação’’ numa prova por etapas. Apesar de terem passados 6 anos, continua bem marcada a marretada. Liguei o piloto automático e fui indo...não conseguia colocar energia nos pedais, passei da segunda posição para oitavo e ainda faltavam 20kms e algumas subidas. Tentei animar-me, relativizar a situação, sim porque há coisas piores. Um atleta partiu o quadro no primeiro dia e não pode continuar a prova, hoje dois atletas do top 10 não arrancaram por causa de problemas intestinais. Mas eu queria tanto ir ao pódio e vi a essa oportunidade fugir-me entre os dedos...Até a líder feminina me ultrapassou nos últimos kms. Bom, não é vergonha nenhuma porque ela anda que se farta! 
 
Assim que terminei a etapa, deitei-me e fiquei ali uns 10minutos assimilando o que me aconteceu. Só me levantei quando me chamaram para ser entrevistado. Apesar de alguma frustração, estou orgulhoso pelo que fiz e pela forma que encaro a competição. E acima de tudo, pela oportunidade de fazer parte desta aventura. Os dados para registar foram 171km com 1 182 de acumulado positivo em 6.13h.

O tempo hoje esteve fantástico, pela primeira vez arranquei sem manguitos. Esteve céu limpo, e calor. Só de pensar que ontem usei manguitos, pernitos, luvas e camisola térmica…
Depois de ter visto milhares de cavalos e vacas, hoje além destes animais vimos bandos de camelos e veados. As águias e os abutres também deram um ar da sua graça e pairaram por cima de nós várias vezes. Em mais nenhuma prova que participei vi tantos e tão variados de bichos. 

O espanhol Marcelo Zamora viu a sua fuga bem sucedida e acabou por vencer a etapa. Em segundo lugar foi para o seu irmão Pau Zamora e em terceiro o líder da prova, Cory Wallace. Nos femininos, tudo se manteve igual.
Depois desta etapa penso que subi 2 lugares na classificação, mas só mais logo ao jantar é que tenho acesso aos resultados. Mas é melhor esperar para ver quais os estragos que o homem da marreta provocou. 

Hoje os Gers onde estamos instalados têm cama e ‘’aldeamento’’ teve mesmo banhos quentes. A primeira vez desde que a prova começou. Quanto às camas, tenho que admitir que o meu corpo já estava um pouco maçado de dormir no chão duro e como o meu saco cama é de verão, rapo um frio desgraçado, mesmo dormindo vestido. 

A última etapa é também a mais curta, com 86km e 1 486m de acumulado positivo. Mudamos novamente de acampamento, deixamos o complexo turístico Gun Galuut para terminarmos no Parque Nacional do Século XIII que é gerido pelo principal patrocinador da prova, a Genco Tour Bureau. De salientar a beleza do local onde estamos instalados, há um enorme lago rodeado por um vale umas colinas que se perdem no horizonte. 

Não sei se amanhã terei condições de escrever o relato da etapa devido às cerimónias previstas. Vou tentar, mas caso não consiga, depois darei notícias. 

João Marinho


Report dia 5 - http://www.joaomarinho.com/2013/09/mongolia-bike-challenge-dia-5.html






NOTA: Irei publicar um relato por dia ao longo dos próximos 7 dias. Atenção que esta prova aconteceu entre 1 e 8 de Setembro, mas não tive oportunidade de colocar os relatos online antes. 



Mais fotos na minha página de atleta no Face Book: www.facebook.com/marinhojoao







quarta-feira, setembro 25, 2013

Mongolia Bike Challenge - Dia 5



A etapa de hoje era previsível que fosse rápida. As montanhas não eram muito longas e muitos kms a rolar no plano. Um bom arranque é fundamental para que se tenha o resto da etapa um pouco mais tranquila, mas o meu corpo não reage muito bem aos arranques tipo ‘’fisga’’. É impressionante o ritmo que é colocado pelo pelotão da frente na partida. Cerca de 5kms depois da partida a diferença mantém-se inalterada ente o segundo grupo e o primeiro, mas recuperar o tempo é muito complicado. O grupo onde andei inserido hoje trabalhou bem e fomos puxando à vez até ao km 35 onde estava a primeira subida do dia. Depois disso fiquei apenas eu e um australiano trabalhando para alcançar outros atletas que se viam ao no horizonte. Por vezes parecem que estão próximos, mas volto a referir, recuperar tempo é muito complicado a não ser que apareçam subidas. A parte final mais ondulante permitiu que recuperasse mais alguns lugares, mas por volta do km 80 a prova virasse literalmente do avesso. 

Um seta apontava para o caminho errado, o grupo da frente foi logicamente na direcção errada e nós em seguida também. Começamos a ver ao longe uma carrinha a vir na nossa direcção seguido de um grupo de atletas, dizem-nos que temos de dar a volta e ir no sentido contrário porque a marcação num cruzamento estava errada. Aos poucos outros grupos se aproximam e dão também a volta. Ninguém sabe se a etapa continua a ser válida ou não. Alguns atletas começam a aumentar o ritmo, eu sem saber bem o que fazer, mas consciente que se alguma decisão fosse baseada nas posições actuais (eu passei para a frente da corrida) não seria justo. Continuei no meu ritmo e o inglês Matt Page tentou distanciar-se, eu fui com ele até à meta, trabalhando em conjunto , rolando a 40km\h e terminando ao sprint. A posição não interessava até que alguma coisa fosse comunicada pela organização. Depois de muito se especular entre os atletas, de se discutir as opções que haveria para encontrar algo que fosse o menos injusto possível, veio uma decisão baseada nos tempos no ponto hoje estava a marcação errada. Bom, a decisão foi muito discutida, muito criticada e todos levantaram dúvidas sobre de que forma os tempos foram tirados. A minha posição contínua igual, estou em 9º com uma curta diferença para o 8º. Os líderes continuam inalterados. 

Com a partida e chegada no mesmo local, hoje fizemos um loop pelos vales e montanhas à volta do acampamento. O cenário continua esplêndido, com um visual a perder de vista, com vales que se estendem por kms e kms. Depois da segunda montanha fizemos o que para mim foi a descida mais divertida da prova. Um double track montanha a baixo, com curvas e contracurvas durante kms. O piso não era escorregadio, a velocidade era alucinante e o visual ‘’wide screen’’ para o vale à nossa frente era extraordinário. 

A etapa de amanhã será a mais longa da prova com 167km e 1 730m de acumulado positivo. Vamos mudar de acampamento, deixamos Kherlen River para nos instalarmos em Gun Galuut. Quando a organização anunciou que neste local haverá banhos quentes toda a gente aplaudiu! Para ser perfeito era ter wifi e cobertura de rede de telemóvel. 

Algo que surpreendeu tudo e todos foi a qualidade do catering das refeições. Alimentos variados, bem cozinhados e em quantidade. Um ponto muito importante a favor da prova. 

João Marinho  



NOTA: Irei publicar um relato por dia ao longo dos próximos 7 dias. Atenção que esta prova aconteceu entre 1 e 8 de Setembro, mas não tive oportunidade de colocar os relatos online antes. 




Mais fotos na minha página de atleta no Face Book: www.facebook.com/marinhojoao