quarta-feira, junho 22, 2011

Cape Epic - África do Sul

Texto escrito em 2008 

Cape Epic 2008 pelo Team Amarante Bike Zone

África do Sul – Breve descrição


Situado no extremo sul do continente africano e que tantas dores de cabeça deu ao navegadores Portugueses ultrapassar nas suas caravelas rumo à índia há 500anos atrás. Com 44 milhões de habitantes é o 25º maior país do mundo e que ultrapassa um profunda remodelação a nível social procurando estabilidade entre as várias raças existentes. 


Existem 3 línguas oficiais além do inglês e mais umas 10 línguas nativas o que diz bem da pluralidade de raças existentes. A moeda é o Rand o que equivale a 8 cêntimos., comparativamente com Portugal o nível de vida é mais acessível principalmente na alimentação onde um hambúrguer custava 60cent. Só para dar uma ideia.
A estação que estávamos era o Outono, bem diferente do Outono Português, durante o dia a temperatura facilmente atingia os 40º e à noite baixava para menos dos 10º com humidade elevada.

Em termos de segurança não tivemos qualquer problema, apesar de haver muita pobreza por todo o país, na zona que estivemos – Western Cape, não tivemos qualquer tipo de chatice e bastante diferente da capital Joanesburgo sendo considerada uma das cidades mais perigosas do mundo.
Uma particularidade é que neste país a condução é pelo lado esquerdo, o cria uma certa confusão no início mas habituamo-nos depressa.


O que é o Cape Epic?

O Cape Epic (CE) realizou-se entre 28 de Março e 5 de Abril sendo a prova por etapas em BTT (Bicicletas Todo Terreno) mais mediática do mundo. Sendo esta a apenas 5ª edição é já um ‘’must do it’’ seja para competir seja para desfrutar deste maravilhoso engenho, que é a bicicleta.
Os 966km e mais de 18 000metros de desnível acumulado, distribuídos pelas 8 etapas mais o prologo inicial torna o CE numa das competições mais exigentes para homens e ´´máquinas´´ do mundo. 

Os atletas tem de vencer diversas dificuldades como o clima desértico onde as temperaturas facilmente ultrapassam os 40º, o terreno que varia entre estradas pavimentadas, estradões em terra batida, trilhos em pedra, dunas, lama, um verdadeiro teste a todos os níveis, quer fisicamente quer mentalmente. O percurso liga a cidade Knysna, junto ao Oceano Indico, a Lourensford próximo da cidade do Cabo. 


Sendo reconhecida pelo órgão máximo do ciclismo - a UCI (União Ciclista Internacional) como uma prova que atribuí preciosos pontos para o ranking mundial, torna o CE numa espectacular competição que juntou 1280 atletas distribuídos por equipas de dois elementos, provenientes de mais de 40 países diferentes onde a competitividade foi elevadíssima. Campeões olímpicos, campeões mundiais, campeões europeus, várias equipas profissionais quer europeias e americanas tornaram a luta pelos primeiros lugares bastante acesa.



Descrição Ambiente

Quando o CE é eleito pela UCI como sendo uns dos 15 eventos melhor organizados do mundo e o director de marketing da marca das três riscas diz ‘’tudo funciona como um relógio’’ consciencializa-nos que não haverá lugar a falhas. De facto tudo o que envolve o CE é um espectáculo digno de se ver.  O Race Village que era montado normalmente em campos de Râguebi que albergava as tendas dos atletas e voluntários, as tendas das varias marcas desde mecânica às massagens, a zona de meta com insufláveis, bandeiras, e o respectivo gradeamento criava um ambiente digno de um campeonato do mundo.


Os 1200 sacos da Adidas entregues aos atletas para colocarem os seus ‘’haveres’’ para os nove dias estavam prontos a serem a levantados à chegada e sempre com putos nas proximidades que disponibilizavam a transportar os sacos em troca de uns Rands.



No final de cada etapa existia a zona do Bike Wash com pessoas treinadas especificamente para lavar as bicicletas e inclusive havia um supervisor a controlar a operação!!!
O parque que albergava as centenas de bicicletas durante a noite tinha segurança constante e para entrar\sair éramos controlados atentamente pelos vigias.



Ao contrário do que acontece noutras provas do género, não disponibilizava alimentação sólida no fim de cada etapa incentivando assim ao consumo e também para desimpedir a zona o que a nosso ver foi bem pois evitou a confusão que já assistimos noutras travessias.
Um serviço que para nós foi inédito foi o Service Drink. Cada atleta que subscreveu este serviço recebeu 5 bidons de 750ml, dois destes eram preparados por nós com sais na noite anterior sendo depois entregues no segundo posto de abastecimento rapidamente e um outro como recuperador entregue no final da etapa.


Apesar de as etapas serem em locais remotos existe sempre alguém no sítio onde menos se espera a aplaudir, principalmente crianças a pedirem chocolates e para baterem as nossas mãos nas nossas.



As equipas médicas acompanhavam a prova constantemente com várias motas e estão preparadas para qualquer emergência. As quedas foram mais que muitas, algumas delas obrigaram os atletas a fazer uma visita ao Hospital. Eu assisti a algumas que me arrepiaram, vi outras em vídeo que me cortaram a respiração, imaginem um pau atravessar uma perna de um lado ao outro….
A alimentação é dentro dos possíveis comestível, tendo em conta que tem de ser preparada no local e para mais de 1500 pessoas diariamente. O jantar abunda a carne de vaca, frango, massa, arroz, legumes…só é pena os temperos que colocam serem bastante diferentes dos que estamos habituados. Quem se descuidava nas horas quando chegava à tenda da alimentação já não encontrava muita variedade, principalmente ao pequeno-almoço.



Ás cinco da manha somos ‘’obrigados’’ a acordar com a buzina do camião e começa a azáfama normal – equipar, pequeno-almoço, levantar as bikes, entregar o saco e deslocarmo-nos à partida para às 7h arrancar.
À noite os preciosos tampões para os ouvidos atenuavam os decibéis para descansar para o dia seguinte e nos (surpreendentes) confortáveis colchões que eram colocados nas tendas.



Partida\Chegada
Se no Transalp a musica que se ouvia minutos antes da partida era Highway to Hell no CE o Countdown to Insanity era o ‘’incentivo’’ aos atletas diário. A chegada era quase sempre nos mesmos campos de râguebi, era arrepiante entrar na recta final, quase sempre ao sprint  dentro das barreiras com os centenas de espectadores a vibrar!!!


O nosso Cape Epic

Entre a partida de Lisboa e a chegada a Knysna houve muito mais do que check in’s, escalas, embarques\desembarques, voos, aluguer de carro…foram 24 horas non stop até chegarmos ao destino final. Viajamos com a casa ás costas literalmente pois transportávamos mais de 90kg distribuídos por 7 malas. O pior foi quando chegamos ao último (de 4) aeroporto em George e faltava a minha bicicleta, nem queria acreditar. Tinha ficado em Cape Town. Prontamente os serviços do aeroporto se encarregaram de a entregar no dia seguinte no hotel onde iríamos ficar hospedados, o que só veio a acontecer dois dias depois, O que nos salvou foram os 4 dias de antecedência  que chegamos a Africa do Sul.


Fomos a primeira das 5 equipas Tugas a chegar, tivemos tempo para tudo, desde descansar, treinar, conhecer melhor a cultura, ambientarmo-nos ao clima, tudo com calma.
Á medida que o grande dia se aproximava Knsyna ficava diferente, os hotéis, os restaurantes, as lojas, as ruas…em todo o lado se falava do ‘’Epic’’, o nervoso miudinho fazia-se sentir cada vez mais.


A edição de 2008 era a primeira vez que se ia realizar um prólogo inicial de 17km num bosque próximo de Knsysna antes de começar a verdadeira dureza. O espectáculo estava montado, os nossos olhos sorriram quando observávamos pela primeira vez a estrutura montada na zona de meta. O ambiente era fantástico! 


Com 9 dias pela frente supostamente deveríamos gerir bem o esforço mas éramos constantemente postos a prova durante as etapas. Desde o início em que os arranques mais pareciam provas de XC, os ataques os pelotões, chegadas ao sprint, descidas vertiginosas, estradões sem fim, subidas intermináveis, dunas… tudo isto poderia acontecer numa só etapa, tempo para descanso não havia, era sempre a dar o máximo, os nossos rostos transpareciam sofrimento.



As etapas iam passando e o nosso objectivo estava a ser conseguido pois até à quarta etapa estávamos nos 25 primeiros mas o volte face aconteceu na quinta etapa quando o meu companheiro de equipa sofreu uma quebra física que o deixou sem forças durante quase 5horas. Num espaço de tempo muito curto, ficamos arredados da frente da corrida, a desistência chegou a estar iminente tal era o sofrimento dele. Nestas alturas é que o lema da prova…’’the true test of partnership’’ foi levado ao limite. 


Só tínhamos um ao outro para concluir a etapa, tudo o resto jogava contra nós, principalmente o vento que vinha de todo o lado, não havia ‘’roda’’. Com muito sofrimento e muita audácia vencemos esta provação e continuamos em prova. No resto das etapas o Zé recuperou fisicamente reflectindo-se depois nos resultados, mesmo assim não conseguimos regressar novamente aos 25 primeiros mas lutamos até ao ultimo momento.
Ficou assim um pequeno ´´amargo´´ porque sabemos que poderíamos ter ficado melhor classificados se não tivéssemos sido vitimas deste contratempo e de algumas avarias mecânicas que sendo imprevisto tem de ser equacionados face à dureza dos 9 dias de prova. 


A dupla de Amarante elevou bem alto o nome de Portugal mostrando que o país tem de estar mais atento a esta modalidade que exige muita dedicação aos atletas que lutam pelos lugares da frente e não lhes é reconhecido o mérito.



Cape Epic em Números

Para realizar uma prova internacional como o CE é preciso uma planificação incrível, e garanto-vos que tudo funciona como um relógio, não há falhas dignas de registo o que torna ainda o CE ainda mais espectacular.
Em termos de comida, 13 500 ‘’muffins’’ foram consumidos assim como 27 000 pasteis, 3 500 pacotes de pão de forma, 79 800 peças de fruta fresca, 2 100 kg de massa, 3 800kg de arroz batatas e outros, 1 400kg de cereais, 21 200 porções de manteiga, 18 000 embalagens de sumo e 11 000 litros de leite.
A corrida envolve 140 veículos incluindo 7 camiões sendo 2 deles TIR’s com reboque, 2 camiões cisterna (34 000litros), 6 carrinhas de carga, 7 veículos frigoríficos, 20 minibus, 10 jipes, 24 motas entre outros.
Diariamente eram transportadas 225 toneladas de carga, incluindo 1 700 cadeiras, 2 400 tendas, 1 400 colchões, 22 000 metros quadrados de área coberta, 700m de vedações, 33 chuveiros individuais, 125 WC’s, 500 000 litros de líquidos sendo 100 000 agua potável.



As restantes equipas Portuguesas

Dentro das 5 equipas cada elemento tinha a sua particularidade, todos éramos diferentes mas ao mesmo tempo iguais, que digam os Chaparros. A boa disposição imperava, apesar do cansaço dos kms havia sempre uma piada para dizer ou uma gargalhada para soltar e neste aspecto o Team M&M liderava com as suas infindáveis anedotas. O espírito de entreajuda para realizar as tarefas era fundamental por exemplo na marcação das tendas ou na compra da comida.


Neste capitulo a equipa da Ota, nomeadamente o Rui sofreu bastante com dores e mesmo criando ferida devido às horas que passou em cima do selim. Os Molenga infelizmente abandonam a prova cedo pois o CE não perdoa quando a preparação física exigida não é levada a sério. 

Sendo um verdadeiro teste às capacidades de físicas de cada atleta, terminar por si só já é um prémio digno de registo, mas cada equipa se esforçou para a melhor classificação possível. Todas as equipas (incluindo a nossa) tivemos pelo menos um dia para esquecer.

R bikes OTA (Rui Pancadares & David Ventura) – 62º
Team M&M (Nuno Machado & André Malha) –  138º
Chaparros – (António Bendito & Pedro Capela) – 230º
Os Molenga – (Sérgio Luís & Carlos Costa) – Não terminaram

Agradecimentos.

Realizar uma prova deste género envolve orçamentos elevados o que implica um esforço muito grande por parte das equipas, principalmente das Portuguesas para estarem presentes neste evento de renome mundial.
Portugal que atravessa uma situação menos boa obrigando as empresas a cortar nas verbas relativas aos patrocínios, especialmente quando o desporto não é futebol dificultou em muito a nossa participação. 


O nosso esforço viu-se compensado com o apoio da nossa equipa – Bike Zone, do nosso município – Amarante Cidade Wireless na pessoa do Dr. Hélder Ferreira, da rede de lojas Bike Zone, Via Nova Race (www.vianovarace.com), Scott USA, Stand Bebe Automóveis, Metalocar, Clínica Dentaria Sandra Dantas na Trofa, e à BTT-TV na pessoa do Nuno Amaral. O papel dos amigos e família é também essencial e fica aqui a nossa palavra a eles: ao nosso treinador Tiago Aragão, Pedro e Fernando Cardoso, Pedro Marinho, Francelino Fernandes, Dr Gustavo Melo, António Navega, Dave Estêvão, Nuno Machado, Rui Fernandes e a todos os que nos acompanharam através do Fórum BTT e que nos deram uns watts extra, entre muitas outras que tornaram esta prova uma realidade para nós e para a Associação Desportiva de Amarante.


No Regresso ainda deu para uma pequena visita a Londres pois tivemos uma escala de 8h na terra de sua majestade. Aproveitamos para visitar os monumentos mais emblemáticos da cidade Londrina....mas desta vez sem bike!


Texto e fotos : João Marinho e Organização, mais informações : joao.marinho@nexplore.pt

A dupla:
Nome: João Marinho e José Silva
Localidade: Amarante
Equipa: Team Amarante Bike Zone
Inicio na competição: 2004

Competições: Ruta de los Conquistadores, Transportugal, Transalp e Cape Epic, algumas Taças do Mundo e dezenas de provas em Portugal  

2 comentários :

  1. A voluntária do Water Point1:24 da manhã

    O Cape Epic é realmente espetacular! E nesse ano lá estava eu dando água para o Português no Ponto de água 2! Nem preciso falar que a bandeira do Brasil da foto é minha! Mas não nos cruzamos não nos falamos...o encontro estava programado, mas não era ali! Prova linda! Todo mundo que curte btt deve fazer ao menos uma vez na vida! :)

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  2. Há coisas que não se conseguem explicar :)

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João Marinho
Mountain biker, trail runner & adventure sports addict