A minha primeira épica, escolhi logo uma jeitosa...
Texto escrito em 2006
PORTUGUESES CONQUISTAM A COSTA RICA!!
Esta “crónica”, visa relatar o melhor possível a nossa participação naquela que é considerada “a mais dura prova de BTT do Mundo”, assim como a encaramos e nos preparamos. Tentaremos transformar em palavras os momentos que nos marcaram para sempre.
A Ruta
La Ruta iniciou-se há 14 anos, não como uma competição, mas como uma expedição, cujo objectivo era contemplar a grandeza dos tesouros naturais deste belo país. Desde então, esta ideia foi mudando tornando-se numa sensacional competição internacional de BTT. É descrita por quem já participou nela como uma das mais difíceis do mundo estando a par do TransAlp na Europa, o Cape Epic em África ou TransRockies na América do Norte. A prova realiza-se na Costa Rica em Novembro e decorre num ambiente tropical característico deste pais. O percurso liga o Oceano Pacifico ao Oceano Atlântico em três dias e cerca de 400km são percorridos ao longo dos vários microclimas existentes neste país. Este é o trajecto que em 1540, demorou aos conquistadores espanhóis cerca de 20 anos a percorrer.
A ideia
Julho, meio da tarde sentado em frente ao computador, a terminar um trabalho da universidade, abro uma pagina da Internet que refere que as inscrições para La Ruta de Los Conquistadores na Costa Rica estavam abertas: de imediato me vieram à memória as palavras do Sr. António Malvar: ‘A prova mais difícil do mundo’ que havia lido na Bike de há uns anos atrás. Começou-se a processar na minha cabeça a ritmo alucinante informação que me levou a concluir, EU VOU à Ruta este ano! Termino o curso académico e antes decidir o quer que seja vou concretizar este sonho.
Depressa o meu amigo Aldo alinhou neste ideia, ainda faltavam cento e muitos dias e milhares de kms seriam absorvidos pelas nossas obedientes pernas… quer fosse em treino, em prova ou mesmo por essa Europa fora em passeio! As semanas foram passando e a data foi chegando rapidamente.
Outubro foi o mês em que marcamos viagens, afinamos o melhor possível as bicicletas, planeamos a nossa estadia na Costa Rica etc.
A viagem foi algo atribulada: primeiro no metro, depois no check-in no aeroporto, depois na escala em Madrid e para terminar 10horas de voo…NÃO foi fácil chegar à Costa Rica!!!
Tínhamos planeado fazer um bike.-tour pelo país nos dias anteriores à prova, para conhecer um pouco da realidade e aproveitar para fazer uma adaptação ao clima, que devido á humidade e mudanças drásticas de temperatura se tornava por si só um obstáculo.
Chegamos e pedalamos
No dia 28 de Outubro de 2006, uma semana antes de se dar o inicio da prova, aterramos na Costa Rica! Bicicletas montadas ás portas do aeroporto de Juan Santa Maria, mochilas ás costas, e como já era de noite fomos directos para um hotel.
No dia seguinte arrancamos de Alajuela de manhã cedo, e após cerca de 45km com muitos altos e baixos e muito calor, paramos numa cidade chamada Grécia, numa loja de bicicletas – CicloCuco, para resolver alguns problemas mecânicos e para nossa surpresa o dono diz-nos que já fez a Ruta 4 vezes e predispõe-se a ajudar em tudo o que for preciso!
Pedimos-lhe alguns conselhos acerca da prova e do país em si e expomos-lhe os nossos planos de viagem pré Ruta ao que ele nos diz (embora por palavras mais simpáticas): “Vocês são malucos, nem pensem fazer tal trajecto e ainda por cima com as mochilas carregadas, a menos de uma semana do inicio pois a Ruta passar-vos-á a factura!” Sugeriu-nos então que deixássemos as mochilas com a bagagem na loja e aproveitássemos o dia para pedalar, mas sem os mais de 12kg as costas que ficariam na loja! Convidou-nos para no dia seguinte o acompanharmos no reconhecimento da segunda metade da etapa inicial da Ruta e assim vermos in loco o que nos ia esperar, pois esta parte era inédita em 2006 e ele queria realizá-la devido aos horrores que eram ditos por quem já a havia feito. Não tivemos palavras para agradecer a amabilidade, prontamente concordamos com as sugestões apontadas e aceitamos o convite.
Ainda nesse dia fizemos mais 70km, que deram para subir ao topo do vulcão Poaz (quase 2600mts de altitude), dos quais 35 eram continuamente a subir. Ficamos deslumbrados com a vegetação verdejante que culminou com a vista para cratera do vulcão que era simplesmente fantástica e regozijante.
No dia 29 de Outubro, tal como combinado fomos fazer o “reconhecimento” que teve início na povoação de S. Pedro de Turrubares…Começamos a rolar calmamente até que surge a primeira parede. Começamos a subir, em desmultiplicações bastante “leves”, mas depois de cada curva que fazíamos o trajecto subia mais, e não aliviava na inclinação. Olho para o Aldo e diz-me ele preocupado “Oh pá, eu não sei se consigo passar nos Postos de Controlo a tempo…”, pois quando chegássemos aquele ponto já vínhamos com mais de 50km nas pernas ao que eu lhe respondo: “Mas é que nem comeces com coisas”…
À medida que avançávamos as dificuldades iam aumentando, era lama até aos joelhos, descidas em que levávamos a bicicleta á mão e com muito cuidado, subidas que nunca mais acabavam e cuja inclinação não fazia prever que era suposto passar ali de bicicleta, rios, cascatas, casas perdidas no meio da selva etc. À medida que íamos ganhando altitude a deslumbrante vista sobre as montanhas e sobre o Pacifico tornou-se arrepiante. Após 50km, chegávamos a El Rodeo, ainda mais mentalizados da dureza do percurso. Durante o resto do dia discutimos os possíveis cenários e a nossa preocupação fazia-se sentir à distância.
No dia 30 de Outubro fizemos cerca de 160km até Jacó, localidade onde a Ruta ia começar, daí a 4 dias! Na loja do já nosso amigo Cuco aproveitamos para lavar a bicicleta pois estava irreconhecível do dia anterior. Despedimo-nos destas fantásticas pessoas que nos receberam e partimos.
Nesse dia apanhamos 4 chuvadas…O que até podia ser considerado relativamente normal, se entre cada uma delas não tivéssemos ficado praticamente secos. Viva o Clima Tropical!
Quando chegamos a Jacó, já de noite, instalamo-nos e jantamos no primeiro restaurante que nos surgiu pois as pernas não colaboravam.
No dia seguinte, limitamo-nos a passear (a pé) pela cidade, ir até praia, fazer umas compras e mudar de hotel para um que nos permitisse confeccionar as refeições poupando assim alguns Colons.
No dia 1 de Novembro fomos rolar um pouco para recuperar e aproveitar mais uma vez para mergulhar nas águas quentes do Pacifico, visto que daí a 4 dias íamos estar em pleno mar das Caraíbas. Acedemos à Internet a partir de uma loja informática e assim conversamos com os amigos e família.
O início!
Quinta-feira, 2 de Novembro, encaminhamo-nos para o hotel Best Western Jacó onde se realizou o levantamento dos dorsais e as cerimónias protocolares. Foi um dia repleto de emoções: estivemos com Thomas Frishknecht, Tom Ritchey, Marla Streb, Tinker Juarez, Adam Craig, Andreas Hesstler e inclusive o organizador da Ruta, Roman Urbina! Fizemos o levantamento dos dorsais (o meu nº 224 e o do Aldo nº 230). O enorme aglomerado de bicicletas que se estava a formar junto à entrada do hotel deixou-nos boquiabertos. Tudo muito bem organizado, uma zona especifica para a imprensa onde se encontravam vários computadores portáteis, e muito Staff que além de profissionais eram simpáticos.
O dia terminou com um desfile de samba e fogo de artificio no hotel. A organização dividiu os participantes por dois hotéis, Best Western Jacó onde iria começar a prova e outro a cerca de 6km deste ponto, no qual ficamos e que de hora em hora partiam Shuttles da organização para nos levar ao Hotel Terrazas del Pacifico.
1ª Etapa – Jacó – El Rodeo
Dia 3 de Novembro, o grande dia, a excitação era muita, fomos obrigados a acordar ás 3 da manhã para tomar o pequeno-almoço e dar tempo para estar na partida ás 5.15h para o arranque da Ruta.
O nervosismo era notório na generalidade dos atletas, comprovando se estava tudo bem com a máquina. Já alinhados para a partida (ainda era noite) o speaker diz-nos que estavam 510 atletas para enfrentar a Ruta, e nós estávamos posicionados sensivelmente a meio do pelotão.
O arranque fez-se na hora prevista, com o raiar do sol, depressa me posicionei na frente, junto de alguns dos meus ídolos. Nem queria acreditar, ali a pedalar ao lado deles. Começávamos numa larga avenida de Jacó onde Tom Ritchey se lembrou de dar o máximo e colar-se à mota da organização olhando para trás a fazendo “caretas” para o pelotão: a risota foi geral entre os atletas.
Lembro-me de desejar pessoalmente boa sorte ao Tinker Juarez ainda antes de entrarmos na terra ao que ele muito amavelmente me respondeu: “Good Luck for you too my friend”. Quando surgiu a primeira subida vários grupos se formaram em função do ritmo, tentei não abusar pois Já sabia o que me esperava. Ao fins de poucas centenas de metros o suor era mais que muito, o piso era escorregadio e obrigava a controlar a pedalada para a roda não patinar, a inclinação… essa nem se fala. Quando atingi o topo ia na companhia do Frisky, e pensei para os meus botões – ganhou o ano passado já sabe como isto é e está a guardar-se! Andamos juntos vários Kms, inclusive ganhei algum avanço sobre ele o que provocou olhares incrédulos das pessoas que assistiam ao longo do percurso. Mais tarde devido a problemas fisiológicos, tive que parar, o que me fez perder algum tempo (risos).
Os trilhos eram simplesmente fantásticos, sobe e desce constante, cursos de água que além de diversificarem o percurso serviam para lavar a transmissão (esta tinha de ser tão bem cuidada quanto o nosso corpo). Os postos de abastecimento estavam bem recheados com tudo o que um ciclista necessita: barras, fruta, gel, água, sais, bolos, etc. não faltava nada. Neste tipo de corridas nunca devemos andar sozinhos e procurei sempre ter companheiros para nos ajudarmos mutuamente. O apoio da população fazia-se sentir, para eles era um grande evento e vibravam intensamente com a nossa passagem.
O ritmo era elevado, tentava saltar de grupo em grupo sem abusar pois já sabia o que me esperava em San Pedro de Turrubares. Conversei com alguns concorrentes que me acompanhavam e nenhum deles sabia como seria essa famosa parte inédita. A passagem pelo 3º posto de abastecimento marcava o início da parte que já conhecia, tentei abastecer-me com tudo o que consegui! No início sentia-me relativamente bem, no entanto o calor junto com o suor queimava a pele, as subidas eram intermináveis, e embora já conhecesse aquela parte as capacidades de raciocínio não ajudavam. Ultrapassei atletas em desespero, um deles foi o vencedor do TransRockies e 2º no TransAlp no presente ano, Andreas Hesstler, e ao passar por ele aproveitei para lhe dar os parabéns e comentar acerca da dureza da Ruta, ao que ele me respondeu: “A mais dura!”, continuando a subir a encosta a pé quase deitado sobre a bicicleta e eu na relação mais leve continuei a subir ao meu ritmo.
Pensei no Aldo e como é que ele se estaria a sentir, e só desejava que estivesse bem. Mais tarde acabei por pagar a factura, comecei a sentir as primeiras cãibras o que me fez pensar seriamente no que ainda tinha pela frente (tanto neste dia como nos dias seguintes) e comecei a dosear mais o esforço, desmontei várias vezes, comia o mais que podia mas mesmo assim começava a ficar derrotado, pensei na minha incapacidade de ultrapassar tamanhas dificuldades, só pedia que chegasse ao fim, foram momentos que me fizeram reflectir nos meus limites… isto era desumano.
Quando cheguei ao último posto de abastecimento, uma enorme assistência brindou-me com palmas e gritos de apoio e com toda a calma do mundo parei, bebi sais até não poder mais, enchi os bidões, ingeri alguma coisa sólida e levei comigo gel e barras. A partir deste ponto faltavam 25km para a meta. Seguiam-se uns breves kms em estrada que não subiam muito e que ultrapassei na relação 22x27,e depois era altura de dar algum descanso ás pernas em descidas vertiginosas que cruzavam várias aldeias a toda a velocidade. As forças já eram muito reduzidas, tentei controlar o melhor que podia a bicicleta, não queria deitar tudo a perder.
Tinham-me dito que ia nos 20 primeiros o que era excelente. Fui alcançado por um simpático adversário que me deu uma pequena saca com gelatina e outra com frutos secos que aceitei com todo o gosto e tentamos ajudar-nos mutuamente mas as cãibras já não paravam de me massacrar… quando entramos nos últimos kms vi um grupo perseguidor de 5 atletas e decidi dar tudo o que tinha, contorcendo-me em dores… olhava constantemente para trás, já não me recordava se faltava muito ou pouco, apenas sabia que quando chegasse ao alcatrão estava a 500m da meta.
O esforço valeu a pena, cortei a meta em 17º… mal cheguei desviei-me um pouco da trajectória e caí sem reacção, estava em agonia… nunca havia feito competição tão dura nem imaginava que isto fosse possível. As lágrimas vieram-me aos olhos, tinha acabado o sofrimento 7.20h depois. Quando me tentei levantar, quase todos os músculos do corpo começaram a contrair-se, não me podia mexer, estava completamente atrofiado. Passado algum tempo e com muito esforço tomei banho, dirigi-me à tenda de massagens mas ninguém me conseguiu tocar: tinha 4 massagistas à minha volta, uns esfregavam os músculos com gelo outros usavam técnicas de alongamentos, e outros tentavam sem sucesso massajar-me, nesse momento puseram-me a alcunha de “Joao ácido lácteo” em tom de riso, mas eu preocupado perguntei – “Amanha posso competir?” – Ao que me responderam afirmativamente apesar de eu pensar seriamente se no dia seguinte iria conseguir levantar-me ou não.
Entretanto o Aldo havia chegado num brilhante 43º: disse-me que se controlou e que doseou muito o esforço e se estava a sentir bem; não escondi a minha admiração. Mas o importante é que tinha passado em todos os controlos com bastante margem. Estava radiante por ter cruzado a meta acompanhado de “Sir” Tom Ritchey, mas a alegria não alimentava e ambos estávamos a precisar de uma boa refeição; dirigimo-nos ao “refeitório” e o esforço passou a ser feito com os maxilares! A zona de meta tinha todas as condições com muita organização. Depressa tentamos apanhar o próximo Shuttle que nos levasse ao Hotel em San José pois queríamos descansar o melhor possível. Antes de aterrar na cama fiz uns bons alongamentos, e senti as pernas completamente massacradas, não sabia como ia enfrentar o dia seguinte.
O vencedor da etapa foi Paez Leon que demorou apenas 6h a concluir os 100km mais duros da minha vida, a este tempo acrescentei “apenas” 1:20h e dá o meu 17º lugar o Aldo demorou 9:30h a concluir a etapa em 43º o que atesta bem a dureza que ultrapassamos (mais tarde viemos a saber que apenas um terço dos participantes tinha acabado dentro dos limites horários, mais de meia centena se tinha aleijado e 17 tiveram que ser assistidos por médicos no Hospital mais próximo devido á gravidade das suas lesões).
2º Dia – Terramall – Aquiares
Despertar ás 4h, tomar o pequeno-almoço ás 4.30h, e partida ás 6.30h… sempre dormimos mais uma hora em relação ao dia anterior. A etapa iniciava-se na periferia da capital San José e consistia em subir ao vulcão Irazú, maioritariamente por estrada e posteriormente descê-lo por trilhos. Mal o sinal de partida foi dado, começaram as hostilidades… o cansaço fazia-se sentir da minha parte mas olhei incrédulo para o que se estava a passar pois o ritmo imposto era bastante elevado…não entrei em loucuras e segui o meu ritmo. Os primeiros kms foram feitos em asfalto, não querendo dizer com isto que foi fácil, muito pelo contrário, a inclinação era tanta que me obrigava a fazer toda a subida ao vulcão no prato pequeno. Vi-me a pedalar com a vencedora da categoria feminina, a Sra. com S bem grande Marga Fedyna sempre a bom ritmo. Durante a “escalada” a vista sobre o vale onde a cidade de San José estava plantada era arrepiante, tentei não me distrair e focar-me unicamente nos pedais e nos adversários, havia troços em terra que inclusivé nos obrigavam a desmontar, mas na generalidade foi em asfalto.
Fomos precavidos para o frio face aos avisos da organização que iriam haver mudanças drásticas da temperatura. No início o sol tostava, mas à medida que fomos ganhando altitude o frio e a chuva fizeram-se sentir. Nevoeiro a partir de determinado ponto dificultava a vista e não se via mais que 10metros à nossa frente.
Antes de chegar à quota máxima alcancei Adam Craig da Giant USA, que ia completamente desgastado, pedalava muito devagar e notava-se que estava a passar um mau bocado devido ao frio. O segundo abastecimento marcava o fim da subida, peguei no essencial para parar o mínimo tempo possível, optando por não vestir o impermeável. A descida era de doidos, com muita pedra, tudo molhado e o mínimo deslize teria consequências graves: uns discos e uma suspensão total fazia sucesso neste terreno. Os kms iam passando e as dores nas mãos, nos braços e nas costas estavam a complicar em muito a tarefa, iam surgindo pequenas subidas que davam para aliviar um pouco as dores, e aquecer também. Sentia-me confiante e consegui alcançar alguns atletas nesta fase, um deles foi novamente o Andreas Hesstler.
O receio de furar era elevado, a trajectória tinha de ser cuidadosamente definida e não podia haver falhas pois as pedras vulcânicas estavam prontas para fazer estragos. Os últimos kms foram feitos atravessando plantações de café a grande velocidade, e quando cortei a meta na povoação de Aquiares o Super Frisky tinha acabado de o fazer segundos antes: ainda não tinha sido desta que ganhei a um dos melhores atletas de sempre desta modalidade. O Aldo fez a etapa sem problemas a registar embora se tenha queixado bastante de dores nos tendões das mãos devido à violenta descida. Esta etapa foi a que ele realizou com mais calma, quer por causa do cansaço do dia anterior quer por causa da etapa que se seguia, que era a mais comprida e devido ao facto de ser a última assustava um bocado.
O vencedor da etapa foi novamente o Paez Leon que beneficiou do azar de Jeremy Bishop pois sofreu uma queda a 2km da meta enquanto era líder com algum avanço e mesmo assim conseguiu completar a etapa em 2º lugar, sendo no entando obrigado a abandonar a Ruta e o obrigou a passar uns dias no hospital devido à gravidade das lesões. Os 66km foram realizados pelo vencedor em 3.25h, eu demorei mais 50min e o Aldo mais 2.30h e classificamo-nos respectivamente em 14º e 55º.
3º Dia Aquiares – Limon
A rotina já não se estranhava, acordar de madrugada, comer ovos mexidos arroz, feijão e frutas tropicais ao pequeno-almoço e rumar ao local de partida que desta vez coincidia com o mesmo lugar onde havia terminado a etapa do dia anterior. A viagem de minibus foi uma grande aventura também, pois o hotel encontrava-se perdido no meio da selva e que beneficiava de uma magnifica vista para o Vulcão Turrialba a cerca de 1h do local de partida. Por momentos pensei que o motorista do autocarro conduzia por estradas nacionais dada a velocidade mas tal não acontecia eram caminhos destinados somente a veículos 4x4, e que alguns deles inclusive os havíamos feito no dia anterior na bicicleta mas não o impedia de “dar gás” para tentar anular o atraso que já se verificava e que deu origem a que arrancássemos muito na retaguarda nem tendo tempo para verificar se estava tudo em ordem com a bicicleta. Devido a isso talvez o “azar” tenha batido á minha porta, durante este dia de competição.
Quando se iniciou a etapa senti que o meu pneu traseiro tinha pouca pressão, e com aquela ansiedade de chegar à cabeça da corrida facilitei pois os primeiros kms eram sempre a subir; no entanto e tal como diz a velha lei de Murphy: “se houver possibilidade de algo correr mal, vai correr de certeza”, numa das primeiras descidas tive um furo (o que momentos antes tinha acontecido a Adam Craig quando o companhava). Coloquei rapidamente uma câmara no pneu, enchi com a botija CO2 mas que se revelou insuficiente para atingir a pressão desejada obrigando a fazer paragem a um atleta pedindo uma para encher mais um pouco.
Daqui em diante não quis outra coisa, uma, duas, três, quatro e cinco furos! Fizeram-me perder bastante tempo. Como não tinha câmara nem bomba sempre que acontecia voltava a pedir novamente a mesma coisa (até uma câmara furada e uma bomba que não funcionava me emprestaram). Uma situação curiosa foi quando um atleta me emprestou uma bomba que me comprometi a entregar no fim da etapa, mas alguns kms após estava ele furado e devolvi-lhe a bomba que estava a precisar.
Durante esta etapa perdi a conta ás vezes que passava pelos mesmos atletas, um deles foi um em singlespeed que também já tinha tido alguns furos, outro foi o nosso amigo Brasileiro que sempre que nos cruzávamos perguntava se precisava de alguma coisa. A etapa não aparentava grandes dificuldades além dos últimos kms na linha do comboio, mas o facto é que o calor apertava, e as subidas existiam e o cansaço dos últimos dois dias já se fazia sentir.
No momento em que trocava de câmara no ultimo furo, já desmotivado pensei - se tiver mais algum espero pelo Aldo e acompanho-o até ao fim, faltavam aqui cerca de 40km para a meta. Felizmente tal não aconteceu e fui avançando na classificação. Como nos tinham dito na apresentação da prova, as estradas não são cortadas para passagem dos ciclistas acrescentando assim algum risco mas também se tornou engraçado pois atravessávamos cidades com trânsito intenso como se nada se tratasse, eram apenas bicicletas a passar.
Quando ao fim de uma recta vi uma seta a verde eléctrico com a palavra Ruta a indicar para a direita e vi a linha do comboio, disse para mim – a “festa” vai começar, começamos a atravessar as famosas pontes intermináveis, saltando de solipa em solipa, em que todo o cuidado era pouco para não cair.
Procurava seguir sempre em grupo o que também dificultava a progressão por vezes, pois as ultrapassagens entre dois carris são praticamente impossíveis. Foram vários kms com a constante trepidação dos vãos da linha do comboio e diversas pontes que tornavam esta etapa muito característica e dura.
Houve também uma ocasião engraçada que foi quando o grupo onde seguia se cruzou com o comboio que vinha em sentido contrario, que já deveria vir prevenido pois vinha quase parado e que parou mesmo para o ultrapassarmos. Os passageiros colocaram-se ás janelas a incentivar-nos vibrando com a nossa passagem. Logo após alcancei o ultimo posto de abastecimento da Ruta, faltavam 16km e tínhamos chegado oceano, daqui em diante o caminho seria paralelo ao atlântico por entre palmeiras e sobre alguma areia sempre num ritmo elevado. Seguia num grupo de 7 elementos todos nós com um andamento semelhante, decidi arriscar e pus-me em fuga dando tudo o que tinha nestes últimos kms, eram os derradeiros da Ruta, ainda alcancei mais um grupo que me permitiu obter a 23º posição com o tempo de 5:38h a cerca de uma hora do primeiro Andrei Amador, que tendo em conta tudo o que me aconteceu não foi nada mau. O Aldo chegou 1:10h depois conseguindo um sólido 52º lugar.
A meta estava montada na Praia Bonita em Limon, em pleno mar das Caraíbas, um local que não iremos esquecer durante longos anos. Assim que terminei a corrida dei um mergulho nas águas que banham o nosso distante Portugal, e sentei-me na areia a saborear o momento. Seguiu-se a festa de encerramento, onde houve muita diversão, muita comida muito convívio com elementos da organização com os ditos craques, momentos para jamais esquecer. O saldo final resultou em dois surpreendentes lugares, o meu 15º e o do Aldo em 45º e assim honrámos as cores nacionais.
E agora, se nos fizessem a pergunta, “Voltarias a fazer La Ruta?”, teríamos que contrariar o Sr. Malvar e com um enorme sorriso no rosto responder: “Claro, se existir oportunidade, é com todo o gosto que vamos dizer: Costa Rica, aqui estamos nós…Outra vez!!!”
Um agradecimento especial aos poucos mas bons patrocinadores que nos ajudaram na medida do possível a realizar este sonho sendo eles a Biciporto, GaiaBike, Source, Crankbrothers e a All4Bikes. Nestas coisas a família não é esquecida e também temos que vos agradecer. O agradecimento final a todas as pessoas que por via electrónica nos fizeram chegar o seu caloroso apoio provocando em nós arrepios na espinha, a todos vocês uma vénia da nossa parte.
Texto: João Marinho e Aldo Cardoso
Fotos: João Marinho e Organização
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